O texto inicia dizendo
que o jovem Samuel servia ao Senhor perante Eli, e em seguida acrescenta que:
«a palavra do Senhor era de muita valia naqueles dias, não havia visão
manifesta. O que se pode depreender disso é que a única referência que o jovem
tinha com respeito a servir ao Senhor, depois de sua piedosa mãe, era estar
diante da autoridade espiritual constituída naquele tempo, o sacerdote Eli,
servindo-o.
No versículo 7 do mesmo capítulo, a bíblia nos acrescenta duas
revelações, sendo que a primeira, diz respeito a Samuel ainda não conhecer ao
Senhor, e a segunda diz que a Palavra de Deus não lhe havia sido manifesta.
Tudo o que ligava Samuel ao espiritual estava relacionado à autoridade
investida sobre o velho sacerdote e à sua voz, que diz após dia lhe comunicava
ensinamentos sobre o sacerdócio e suas atribuições.
Aqui notamos o cuidado do
escritor do texto sagrado em apresentar a afinidade que o servo Samuel tinha
com seu mentor, a ponto de tal afinidade ser o ponto de contato entre Samuel e
o espiritual. O leitor pode extrair dessa verdade histórico teológica uma
grande lição de cunho ético, absolutamente imprescindível para o exercício do
ministério cristão; quem é chamado por Deus para liderar, antes deve aprender a
servir, quem foi separado pelo Eterno para estar em posição honrosa, antes
precisará honrar, e quem o altíssimo escolhe para se revelar através de sua
Palavra, primeiramente deverá aprender a aceitar a voz de quem foi estabelecido
como canal de revelação hermenêutica e exegética da vontade divina contida em
sua Palavra. Somente depois de ter esses valores arraigados em sua alma e
espírito é que finalmente Deus se manifesta para falar diretamente ao jovem
Samuel. Mas o teólogo diligente é convidado aqui a considerar mais alguns
pontos importantes dentro da revelação bíblica.
1 - Eli foi o primeiro
a perceber que o Eterno estava falando, não por ouvir a voz do Senhor, porque
naquela altura dos fatos, o Altíssimo já havia decidido se revelar mais
profundamente a a alguém capaz de obedecê-lo sem reservas, que não era o caso
de Eli! Contudo, apesar do silêncio divino sobre si, viu algo diferente
acontecendo na vida do jovem que lhe servia. Deus fala de muitas maneiras e em
muitas circunstâncias, o crente atento observará tudo o que acontece ao seu redor,
porque mesmo que haja silêncio sobre o interlocutor, o locutor celestial estará
buscando se revelar a alguém. Participar do processo, orientando a quem ainda
não conhece ao Senhor, redunda em frutos para a eternidade para aqueles que
prestam atenção ao que o Pai quer revelar e/ou fazer; não apenas para si
próprio, mas para e sobre aqueles que o
cercam. Depois de três vezes, Eli percebeu que o Senhor estava falando
novamente! Não com ele diretamente, e sim com o garoto filho de Ana, que nem
seu descendente era! mas ele não se negaria a contribuir para o ministério e a
chamada de Samuel, esse erro ele não adicionaria à sua lista de falhas.
2 - Antes de
prosseguir no mergulho na revelação, Samuel precisou ouvir à orientação vinda
do velho sacerdote. Deus se manifestou de forma a conduzir justamente a isso,
Samuel precisava ouvir o sacerdote para avançar dentro do plano de Deus.
Quantas vezes algo terá que acontecer ou deixar de acontecer em sua vida até
que você entenda que Deus está dizendo algo? Há pessoas batendo em portas
fechadas e que não se abrirão, simplesmente porque não conseguem entender que
uma porta fechada é a voz do Senhor dizendo que o caminho tomado está
equivocado. Nesses momentos é melhor parar e perguntar ao Sumo Sacerdote Jesus
Cristo qual é o melhor caminho a se tomar.
A questão é : alguém não avança nos propósitos divinos tão somente
porque se recusa a ouvir a voz dos sacerdotes estabelecidos por Deus, não
somente na igreja em que congrega, mas também em relação àqueles que o Todo
Poderoso constituiu em diversas áreas da vida de cada um. Por exemplo, no lar
quem exerce essa autoridade sacerdotal é
esposo e pai, mas a rebeldia semeada pelo diabo, tem distorcido as
relações familiares assim como as ministeriais, impedindo as pessoas de irem à
um nível mais profundo do coração de Deus, isso porque não conseguem ouvir as
orientações através de pessoas as quais, por uma razão ou outra (não a de
Deus), o interlocutor reprova como orientadores
3 - Para Samuel a voz
de Deus lhe pareceu a voz do sacerdote com o qual estava acostumado a servir no
santuário. O altíssimo estava trabalhando para levantar um homem segundo o seu
coração, entretanto, ao se manifestar, chamou a atenção de seu escolhido diretamente
para aquele que Ele anteriormente já havia estabelecido. Eli sendo ainda o
sacerdote oficial, é quem representava a autoridade divina, e o Senhor respeita
isso a ponto de fazer com que sua voz remetesse o jovem Samuel à Eli, e não a
outra direção, não a outra pessoa ou autoridade. Eli ainda era o canal
estabelecido por Deus para revelar sua vontade, e mesmo que o sacerdote não tivesse mais intimidade suficiente, para
ouvir a voz de Deus e manifestar a palavra divina ao jovem obreiro, o Criador ainda o permitiu aconselhar a
Samuel, segundo sua própria experiência adquirida em tempos de maior intimidade
com o Pai. Foi preciso que Samuel o interpelasse três vezes até que percebesse
que o Senhor estava fazendo algo ali, mas, ao perceber, Eli faz uso de sua
última oportunidade para ser útil à Deus. O velho sacerdote orienta o jovem
escolhido do Senhor a voltar e deitar-se, contudo, agora com uma resposta
definida para ser alvo da continuidade da revelação do Pai.
4 - A humildade
precede a honra, e a sabedoria livra das armadilhas do orgulho. Quando o
estudante da bíblia lê o capítulo 3 e o verso 9, percebe que há na resposta de Samuel, uma diferença em
relação ao conselho de Eli. E qual seria tal diferença? O sacerdote aconselha o
jovem obreiro a colocar em sua resposta ao chamado do Senhor, o nome divino, o
tetragrama sagrado que contém o nome de Deus, nome impronunciável por conta do
extremo cuidado dos judeus em não falar pronunciá-lo em vão. A pronuncia
correta se perdeu através dos tempos e somente na eternidade a saberemos
finalmente. Samuel poderia ter se ufanado por duas razões: uma que o Senhor o
estava chamando para falar-lhe, outra porque o próprio sumo sacerdote o
aconselhara a o fazer, contudo, Samuel em sua resposta suprime o nome do Eterno,
isso não foi por desobediência ou qualquer resistência à voz de seu líder
ministerial, mas simplesmente por conta de sua humildade, a qual o manteve
justamente onde e como deveria estar, na presença do Eterno, mas com atitude de
total humilhação a ponto de não se considerar digno de pronunciar o seu nome,
mesmo sendo o seu servo. Me faz lembrar de João Batista, que na presença de
Jesus, assume sua indignidade até para se humilhar diante dele, pois disse:
«não sou digno de abaixando-me desatar as sandálias de seus pés. Este tipo de
atitude honra e agrada a Deus, e Ele exalta a quem se humilha. Em resposta à
atitude de Samuel a bíblia apresenta o texto do versículo 10 onde o Senhor
(Iaveh):
a) - Veio - se
aproximou do objeto de sua revelação!
b) - ali esteve -
estabeleceu relação de proximidade divina com seu servo
c) - chamou como das
outras vezes - manteve o padrão pelo qual estava agindo sobre seu servo. Não é
Deus quem tem que mudar, somos nós!
d) - e disse a
Samuel... - Trouxe a revelação de sua Palavra e de sua vontade ao seu filho,
que agora estava apto a ouvi-lo. Samuel estava na presença do Todo Poderoso ao
mesmo tempo que a tinha sobre si mesmo.
Deus fala, mas o homem
deve estar atento aos caminhos de Deus, às maneiras pelas quais a bíblia
apresenta seus métodos divinos, afinal de contas Ele é Deus, Ele é Senhor, e
tudo deve ser conforme o modelo que por Ele é determinado.